TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.IOL.PT, A 24 DE NOVEMBRO DE 2014:
«Ela não vai concordar comigo em tudo. E, sabe, uma das vantagens de
concorrer a presidente é que podemos tomar as nossas próprias posições.
E Hillary Clinton poderá vir a ser uma grande presidente».
Barack Obama, entrevista a George Stephanopoulos, na ABC
«Ao abdicar das suas responsabilidades, a Câmara dos Representantes
para esta ação executiva, seguindo os precedentes de Presidentes de
ambos os partidos há várias décadas. Apoio a decisão do Presidente
Obama»
Hillary Clinton, «statement» de reação ao plano de ação executiva anunciado por Obama para a Imigração
A relação entre Barack Obama e Hillary Clinton é a pedra angular
para se perceber a dinâmica do Partido Democrata na última década.
Para se perceber os méritos e insucessos do partido do burro nos
últimos dez anos, temos que olhar para as escolhas e hesitações do atual
Presidente e da ex-Secretária de Estado e mais-do-que-provável nomeada
presidencial para 2016.
O histórico duelo que ambos protagonizaram nas primárias para a
nomeação presidencial de 2008 ditou a eleição do primeiro presidente
negro da América e impediu (ou, pelo menos, adiou) a eleição da primeira
mulher.
Depois de batalha intensa e, por momentos, agreste, Barack Obama
surpreendeu ao escolher Hillary Clinton para Secretária de Estado do seu
primeiro mandato.
E, contra muitas previsões, o «armistício» entre Obama e os Clinton
foi sólido e frutuoso: os primeiros quatro anos da era Obama tiveram no
plano internacional alguns dos seus melhores momentos e isso teve muito
a ver com a competência de Hillary Clinton. (a exceção foi Bengasi e o
assassinato do embaixador americano na Líbia).
Quanto a Bill, depois de palavras infelizes nas primárias de 2008 a
tentar desvalorizar triunfos de Obama em estados com muitos eleitores
negros, teve redenção brilhante na Convenção de Charlotte, em setembro
de 2012, dando empurrão decisivo à reeleição de Obama, com argumentário
convincente dos méritos do primeiro mandato.
A opção de Hillary (anunciada bem antes da reeleição de Obama) de
não participar na segunda administração terá muito a ver com a
preparação de terreno para a sua campanha presidencial de 2016. Mas
explica-se, também, por uma leitura que fez de que seria necessário ter
espaço para se demarcar do Presidente em alguns pontos.
Não todos, como nos últimos dias se verificou: dias depois de
derrota tremenda dos democratas nas intercalares, com forte grau de
responsabilização da impopularidade do Presidente, Hillary não hesitou
em apoiar a jogada de Obama de se sobrepor ao «gridlock» do Congresso
republicano, avançando para a Reforma da Imigração pela via das ações
executivas unilaterais.
É certo que, há uns meses, Hillary não se coibiu, em entrevista à
«The Atlantic», de se distanciar de Obama em questões como a guerra na
Síria e mesmo na política de alianças com Israel.
Mas mesmo na frente externa, a provável nomeada do Partido
Democrata tem-se mantido fiel à visão do Presidente, depois de quatro
anos de total sintonia, quando serviu na primeira Administração Obama:
conceitos de «retirada» e «contenção» nas guerras do Iraque e
Afeganistão; uso de drones e evitamento a todo o custo de «boots on the
ground»; travagem do Estado Islâmico pela via dos ; parceria exigente
com Israel, com críticas pelos excessos na última ofensiva terrestre a
Gaza, mas apoio político a Telavive.
No tabuleiro político interno, Barack Obama entrou, claramente, na
reta final da sua presidência. A ação executiva unilateral sobre
Imigração foi sinal claro de que o Presidente continuar a ser «player»
influente, embora retraído por um Congresso politicamente hostil.
E, na entrevista que deu a George Stephanopoulos, à ABC, Obama deu
dois sinais claros: tem consciência das limitações políticas que terá
nos últimos dois anos e fará tudo para as contornar, de modo a cumprir a
agenda política que fez aprovar na reeleição (Imigração, Energia,
Reforma Fiscal, contenção da dívida e défice); vê como inevitável que os
democratas comecem a virar-se para Hillary Clinton, no sentido de
segurarem a Casa Branca para lá de 2016.
«Os norte-americanos querem conduzir um automóvel que não tenha o
mesmo cheiro (…) Querem um novo começo. Não querem conduzir um carro com
tantos quilómetros como eu», admitiu Obama nessa entrevista.
«Hillary Clinton pode ser uma candidata formidável e uma grande
presidente. Estou muito interessado em assegurar que tenha um sucessor
democrata na Presidência», apontou Obama.
A transição de Obama para Hillary está, por isso, em marcha no
universo democrata. Mas isso ainda não significa o fim da história para
Barack Obama. Esse fim já foi decretado tantas vezes e, bem vistas as
coisas, o anúncio foi sempre precipitado.
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