TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.IOL.PT, A 22 DE JULHO DE 2013:
Era a mais antiga e mais respeitada jornalista política norte-americana. Durante
meio século, teve lugar cativo na primeira fila na conferências de Imprensa na
Casa Branca.
Helen Amelia Thomas, nascida a 4 de agosto de
1920, em Winchester, Kentucky, morreu no sábado, com 92 anos, vítima de doença
prolongada.
Quase até ao último dia, manteve-se no ativo,
polémica e acutilante, incómoda e direta. Uma imagem de marca da sétima de nove
filhos de um casal de libaneses que emigrou de Tripoli (então território sírio)
e embarcou nos EUA pela Ellis Island (como tantos outros o fizeram no início do
século XX).
Foram sete décadas no jornalismo, desde 1943.
Durante meio século, teve direito a um lugar no primeira fila nas conferências
de Imprensa na Casa Branca, sem medo de fazer perguntas incómodas a dez
presidentes americanas (o último deles, Barack Obama).
A teimosia
em não fazer cedências ao discurso oficial da Casa Branca fez com que levasse ao
desespero vários porta-vozes das administrações americanas. Quando viam Helen
pedir a palavra, sabiam que vinha aí pergunta difícil para o poder político.
No elogio
após saber a notícia da sua morte, o Presidente Obama disse de Helen Thomas que
ela deixa uma «herança de firmeza e tenacidade. Tinha uma crença feroz de que a
nossa democracia funciona melhor se as perguntas difíceis forem feitas, de modo
a manter sob forte escrutínio os nossos líderes políticos».
«Helen foi
verdadeiramente uma pioneira e manteve os pés dos Presidentes (incluindo os
meus) bem assentes na terra», referiu Obama.
A
expressão «pioneira» não foi um exagero retórico do Presidente. Helen foi a
primeira repórter política na Casa Branca. Era uma instituição do meio político
americano. Mas nunca foi consensual.
Em 2010, já quase com 90 anos, foi apanhada a
dizer, em off, que «os judeus deviam sair da Palestina e voltar à terra deles».
Helen
pediu desculpa pelo deslize e explicou mais tarde: «Aquelas observações não
refletem os meus sentimentos em relação à vontade de paz no Médio Oriente. Ela
só acontecerá quando as diferentes partes em conflito reconheçam a necessidade
de se respeitar mutuamente. Que esse dia surja em breve».
Apesar das
desculpas. a polémica custou-lhe o afastamento das conferências de Imprensa em
DC.
Trabalhou para a United Press International
(desde a década de 60, durante a presidência Kennedy). Escreveu três livros,
todos sobre a experiência de jornalismo político na Casa Branca.
Que visão
tinha Helen sobre as obrigações de um Presidente? «Cobri sempre
jornalisticamente o Presidente dos EUA com a noção de que ele é sempre o máximo
e último responsável».
À luz deste princípio, que a guiou do início ao
fim, para Helen não havia limites para se colocar uma questão, por muito
delicada e incómoda que ela fosse. Dentro deste espírito, não poupou a herança
de George W. Bush, sobretudo pela forma como este reagiu ao 11 de Setembro e
avançou para as guerras. No rescaldo dos dois mandatos do 43.º Presidente dos
EUA, Helen rotulou George W. Bush de «pior presidente de sempre».
Mas a
Administração Obama também não escapou à mira exigente de Helen. Já quase nos 90
anos, assumiu um episódio ainda hoje recordado em Washington.
Numa fase inicial do primeiro mandato em que a
Reforma da Saúde parecia comprometida, Helen Thomas repetia questões incómodas a
Robert Gibbs, que fazia os briefing diários da equipa de Obama.
Robert
teve uma a observação imprudente: «Se já sabe que não posso dizer mais do que
isso, porque é que insiste em fazer-me a pergunta?»
Helen
atirou: «Porque quero que a sua consciência o incomode».
Os
restantes jornalistas desataram a rir e o respeitável Robert Gibbs ruborizou,
sem retaliação possível.
Helen Thomas vai fazer falta em Washington.
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