A pouco mais de um mês do arranque das convenções partidárias (18 a 21 de
julho no Quicken Loans Arena, em Cleveland, Ohio, do lado republicano; 25 a 28
de julho no Wells Fargo Center, em Filadélfia, Pensilvânia, no campo democrata), o duelo
Trump/Hillary, na prática, já começou.
O tiro de partida, mesmo que não de forma
oficial, foi o modo claro como Hillary derrotou Sanders na última ronda de
primárias, obtendo claras vitórias na Califórnia e na Nova Jérsia, e ainda um
triunfo apertado, mas significativo, no Novo México (desmontando assim a ideia
de que Bernie poderia ainda surpreender Hillary se lhe «roubasse» o voto
hispânico).
Os dados são objetivos – Hillary passou já em
cerca de 450 delegados o «número mágico» para obter a nomeação – e o encontro
do Presidente Obama com Bernie Sanders, na Casa Branca, no dia seguinte a essa
ronda de primárias, terá sido a última machadada nas esperanças do «universo
Sanders».
Barack tentou chamar Bernie à razão,
lembrando-lhe que, há precisamente oito anos, Hillary Clinton teve a capacidade
de colocar de lado as frustrações de não ter sido nomeada, mesmo tendo obtido
18 milhões de votos, e juntou-se a Obama, no esforço de contribuir para a eleição
do candidato democrata.
Sanders, aparentemente, não se mostrou muito
sensibilizado com os apelos do Presidente e saiu do encontro dizendo aos
«media» que não vai desistir e que seguirá para as primárias em Washington DC.
Bernie sustenta-se no facto dos superdelegados
poderem mudar de ideias até à Convenção – o que, sendo uma possibilidade
teórica, não é um cenário realista, atendendo ao facto de Hillary ter garantido
supremacia sobre Bernie em todos os capítulos.
O que faria, nas próximas semanas, mais de cinco
centenas de superdelegados fletir dramaticamente de Clinton para Sanders?
Mais significativa foi a declaração do senador do
Vermont, no sentido de que «o mais
importante será que o movimento que fizemos crescer nesta campanha inesquecível
faça tudo para travar uma eventual Presidência Trump».
Obama: «Bernie fez de Hillary uma candidata ainda melhor»
Obama, em entrevista a Jimmy Fallon no dia
seguinte ao encontro com o senador Sanders, fez questão de elogiar «a grande
caminhada de Bernie», sentenciando: «Não tenho dúvidas de que as ideias e as
propostas lançadas a debate por Sanders contribuíram para que Hillary Clinton
se tornasse numa candidata ainda melhor».
Sem qualquer surpresa, o Presidente endossou a
candidatura de Hillary Clinton (que, na prática, apoia desde o início),
declarando: «Possivelmente, nunca existiu
uma candidata tão conhecedora, tão experiente e tão bem preparada para o cargo de
Presidente dos EUA como Hillary Clinton».
Nas próximas semanas, possivelmente ainda antes
do arranque da Convenção de Filadélfia, é de esperar que Sanders se renda às
evidências e declare apoio sólido a Hillary, de modo a tentar estancar uma
«fuga» significativa de votantes seus nas primárias para Trump na eleição
geral.
O risco é real: algumas sondagens apontam uma
bolsa entre os 8 e os 12% de votantes Sanders nas primárias a admitirem
preferir Trump em detrimento de Hillary na eleição geral.
O espanto não será assim tão grande: Sanders
baseou grande parte do seu crescimento na crítica ao sistema de poder,
colocando Hillary como uma das mais claras representantes desse «establishment»
diabolizado.
Ainda assim, e de acordo com sondagem
Reuters/Ipsos feita nos dias seguintes à confirmação da maioria Hillary para a
nomeação, Clinton segura, de imediato, três quartos do eleitorado democrata
para a eleição geral, sendo que, do lado republicano, Trump se fica pelos 70%
(42-34 a favor de Hillary no resultado global dessa sondagem).
Romney não apoia mesmo Trump
Do lado republicano, a campanha de Donald Trump
vai dando sinais de que pretende apresentar, nos próximos tempos, o seu
candidato com uma versão mais soft e não tão politicamente incorreta, mas o
próprio Trump dá mostras de não querer ir por aí.
Os comentários de teor racista que Donald teceu
nos últimos dias, sobre juiz do Indiana de origem mexicana, levaram Mitt
Romney, nomeado presidencial republicano de 2012, a reafirmar, em entrevista a
Wolf Blitzer, na CNN, que não vai mesmo apoiar o seu sucessor como candidato
republicano.
Mitt vai mais longe e acusa Donald de não estar à
altura da nomeação: «Não deve ser o exemplo para futuras gerações ou
o exemplo da América para o Mundo. Não quero ver o Presidente dos EUA a dizer
coisas de natureza racista que mudem o coração e o caráter deste país».
Romney, entretanto, levou já a réplica por parte do diretor de campanha de Donald Trump. Paul Manafort não fez a coisa por menos e chamou Mitt de «cobarde». «Podia ter entrado na corrida presidencial de 2016 e escolheu não o fazer. Agora critica Trump, que teve mais 3,5 milhões de votos nas primárias do que ele em 2012...»
Romney, entretanto, levou já a réplica por parte do diretor de campanha de Donald Trump. Paul Manafort não fez a coisa por menos e chamou Mitt de «cobarde». «Podia ter entrado na corrida presidencial de 2016 e escolheu não o fazer. Agora critica Trump, que teve mais 3,5 milhões de votos nas primárias do que ele em 2012...»
Na mesma linha de Romney, David Brooks, colunista muito influente
do «New York Times», de tendência conservadora, representa uma corrente
realista e pragmática da Direita americana, que ainda se encontra numa espécie
de… estado de choque perante a inevitabilidade de Trump.
Ora, Brooks, que numa situação normal se
colocaria do lado do nomeado republicano contra Hillary, vê Clinton como a
solução óbvia para evitar um desastre Trump: «Continuo a acreditar que as pessoas se vão fartar de Donald Trump e
irão preferir Hillary Clinton. Pelo menos ela será competente e será normal», apontou
o analista e comentador, em debate na PBS.
Sim, a campanha promete ser feia
A menos de 150 dias do momento que definirá a
sucessão de Barack Obama, o relógio já começou a contagem decrescente.
E, tendo em conta as características, as
histórias de vida e o passado dos dois candidatos, não vale a pena ter grandes
ilusões: a campanha vai ser feia.
Donald Trump vai prometendo, nos comícios, que terá
revelações comprometedoras a fazer nos próximos tempos sobre a sua adversária
para novembro: «Nem sei bem se ela terá
condições de ser candidata mesmo, mas vamos ver…», aponta o futuro nomeado
republicano, insinuando que a questão dos emails poderá levar a uma acusação
formal contra Hillary por parte do FBI.
Possivelmente nunca terá havido um duelo assim
para a eleição geral: Hillary tem níveis de rejeição de 40% ou mais (esse dado
terá sido decisivo para que Obama levasse a melhor na corrida à nomeação
democrata há oito anos); mas Donald, esse, passa os 60% de americanos a dizerem
que não gostam dele ou têm, pelo menos, opinião negativa.
É claro que os próximos meses podem mudar essa
perceção, mas fica difícil vislumbrar como pode um candidato com um nível de
rejeição tão elevado sonhar com a vitória em eleição tão complexa como é a
corrida presidencial norte-americana.
O melhor mesmo é aquecerem os motores e apertarem
os cintos: o grande duelo está a começar e a campanha não vai ser bonita.
Mas, em vários sentidos, será interessante e
imprevisível.
Hillary parte em vantagem, embora pareça estar em
relativa perda nos últimos meses. Trump é o «cisne negro» que quase ninguém
previu, mas que tem vindo a desmontar mitos e supostas certezas de analistas,
comentadores e políticos.
Nunca é prudente desvalorizar o grau de incerteza
que a política americana nos reserva. Para o bem ou para o mal, não há outra
realidade mais rica, contraditória e desconcertante.
E as suas fraquezas e os seus defeitos tornam-se,
muitas vezes, a sua principal força.
Faltam 149 DIAS para as eleições presidenciais
nos EUA.
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