Já todos sabíamos que as eleições
presidenciais nos EUA não gostam de vencedores antecipados ou de coroações
anunciadas.
Mas o que
está a acontecer nesta corrida de 2016 é diferente.
Algo novo,
sem grelha de comparação com nada do que se tenha vivido nas últimas décadas.
E se isso
tem sempre um lado misterioso e interessante para o acompanhamento mediático e
político, a verdade é que, desta vez, há ingredientes um pouco assustadores no
guião deste filme com final absolutamente em aberto.
«Hillary vs
Trump», em situação normal, era vitória certa e antecipada para a democrata,
que partiu para esta corrida com vantagens de 50 pontos para a nomeação e 20 ou
30 para a eleição geral.
Certo?
Pois. A
questão é que esta é mesmo uma eleição diferente. Atípica. Anómala.
Pelas
inesperadas dificuldades de Hillary matar definitivamente a dúvida em relação
ao duelo com Sanders para a nomeação presidencial democrata.
Pela caminhada
totalmente imprevista e até bizarra de Donald Trump rumo à nomeação republicana,
destronando, um a um, as esperanças presidenciais de nomes que prometiam ser
viáveis, como Jeb Bush, Marco Rubio, Chris Christie, Rand Paul, Scott Walker,
Carly Fiorina e até Ted Cruz.
Pelo
sentimento de desconforto no sistema que tudo isto está a gerar em Washington
DC e até nos media norte-americanos.
Ainda assim,
se a eleição presidencial que vai definir o sucessor de Barack Obama na Casa Branca
fosse hoje, seria relativamente pacífico afirmar que a vitória iria para
Hillary.
A vantagem dos democratas no mapa
eleitoral
Mesmo que
algumas sondagens nacionais nas últimas semanas tenham colocado os dois futuros
nomeados taco e taco (duas ou três a porem mesmo Trump ligeiramente à frente no
voto popular), a verdade é que há registo consistente e continuado de avanço
sólido de Hillary no plano nacional, sobretudo no mapa eleitoral por estados (e
é isso que vai contar para definir o novo presidente, a 8 de novembro).
Em próximas
crónicas dedicarei atenção pormenorizada ao evoluir do mapa eleitoral por
estados (vale bem a pena).
Mas para
simplificar o momento atual, a questão é a seguinte: Hillary parte com vantagem
significativa nos estados que vão decidir.
Partindo da
base Obama vs Romney de 2012, convém lembrar o que atual Presidente somou, na
noite da sua reeleição, 332 votos eleitorais, contra apenas 206 do
ex-governador republicano do Massachussets (são precisos 270 para vencer).
Ora, os
primeiros indicadores mostram que Trump muito dificilmente conseguirá sequer
chegar aos 206 de Romney, muito menos atingir uma situação que inverta a
vantagem com que, pelo menos aparentemente, Hillary parte.
Para uma
vitória Trump em novembro, Donald teria que roubar a Hillary pelo menos quatro
destes cinco estados, se mantivermos os muito «latinos» Colorado e Novo México
do lado democrata: Wisconsin (democrata nas últimas seis eleições
presidenciais), Ohio (democrata nas últimas duas), Pensilvânia (democrata nas
últimas seis eleições presidenciais), Michigan (democrata nas últimas seis
eleições presidenciais) ou Florida (democrata nas últimas duas eleições
presidenciais).
É possível
inverter?
Claro que é,
sobretudo se nos lembrarmos que estamos a falar da política americana, talvez o
universo mais complexo e difícil de antecipar.
Mas seria,
convenhamos, uma alteração dramática da tendência eleitoral no histórico
recente das eleições presidenciais norte-americanas.
E há grandes
sinais a apreciar: as últimas cinco ou seis eleições presidenciais mostraram-nos
que há, sobretudo, nos estados competitivos (aqueles que tanto podem dar
vitória a democratas como a republicanos), uma vantagem natural do Partido
Democrata, por razões demográficas.
Minorias
como os latinos, os negros ou até nalguns casos os asiáticos têm peso crescente
em estados como a Florida, a Virgínia ou o Colorado.
O «cisne negro» que pode baralhar
tudo
Onde pode
estar o «cisne negro» desta eleição? Sobretudo se, desta vez, até essa grelha
de análise não se verificar.
Ou seja: a
suposta vantagem confortável de Hillary no mapa eleitoral funda-se no
pressuposto de que, na Florida e no Colorado, Clinton vencerá claramente se
conseguir fixar boa parte do eleitorado latino (que nas últimas duas eleições
preferiu Obama sobre McCain e Romney numa relação superior a dois em cada
três).
E há até quem defenda, no seio da campanha Hillary, que vale a pena explorar a possibilidade de competir no Arizona, estado fortemente republicano nas últimas eleições presidenciais, mas com enorme peso latino.
E há até quem defenda, no seio da campanha Hillary, que vale a pena explorar a possibilidade de competir no Arizona, estado fortemente republicano nas últimas eleições presidenciais, mas com enorme peso latino.
Tendo em
conta o que Donald Trump tem dito dos mexicanos, era de supor que, desta vez, a
vantagem da nomeada democrata sobre o nomeado republicano seria até maior nesse
segmento.
Só que… não
é bem isso o que as primeiras sondagens estão a dizer.
No texto «Nuestro amigo: some Latinos see Trump as
friend and ally» (Nosso amigo: alguns latinos vêem Trump como amigo e
aliado), Lucy Scott expõe a contradição inquietante.
«As observações de Donald Trump sobre os hispânicos – ‘eles trazem drogas, eles trazem crimes, eles são violadores’, disse ele sobre os imigrantes mexicanos no verão passado – foram rotuladas de racista s e chocantes», começa por apontar Lucy Scott, para depois fundamentar.
«62% dos votantes hispânicos, em sondagem recente da CBS, mostram-se desfavoráveis a Trump. No entanto, na fronteira Texas-Mexico, Trump goza de forte apoios de americanos de origem hispânica. E isso pode ser surpreendente. O Texas tem a segunda maior fatia de hispânicos de todos os EUA, incluindo cerca de cinco milhões de latinos com possibilidade de votar nas eleições presidenciais norte-americanas. Tony Castaneda, neto de imigrantes mexicanos no Texas, votou Trump nas primárias republicanas: ‘Sou antigo chefe de polícia na fronteira. Sou hispânico, tenho orgulho em ser hispânico e apoio a 100% a candidatura de Donald Trump à presidência dos EUA’, disse ele à CBS News. Ele não se sente ofendido com as observações de Trump. ‘Ele é muito duro e direto. Eu também sou. Talvez seja por isso que gosto de muitas das suas posições, porque ele não atira ao lado. Atira bem no alvo. Fala direto, vai direto ao assunto. Ele não é politicamente correto’».
«As observações de Donald Trump sobre os hispânicos – ‘eles trazem drogas, eles trazem crimes, eles são violadores’, disse ele sobre os imigrantes mexicanos no verão passado – foram rotuladas de racista s e chocantes», começa por apontar Lucy Scott, para depois fundamentar.
«62% dos votantes hispânicos, em sondagem recente da CBS, mostram-se desfavoráveis a Trump. No entanto, na fronteira Texas-Mexico, Trump goza de forte apoios de americanos de origem hispânica. E isso pode ser surpreendente. O Texas tem a segunda maior fatia de hispânicos de todos os EUA, incluindo cerca de cinco milhões de latinos com possibilidade de votar nas eleições presidenciais norte-americanas. Tony Castaneda, neto de imigrantes mexicanos no Texas, votou Trump nas primárias republicanas: ‘Sou antigo chefe de polícia na fronteira. Sou hispânico, tenho orgulho em ser hispânico e apoio a 100% a candidatura de Donald Trump à presidência dos EUA’, disse ele à CBS News. Ele não se sente ofendido com as observações de Trump. ‘Ele é muito duro e direto. Eu também sou. Talvez seja por isso que gosto de muitas das suas posições, porque ele não atira ao lado. Atira bem no alvo. Fala direto, vai direto ao assunto. Ele não é politicamente correto’».
Estará aqui
uma das explicações para o sucesso de Trump?
Sistema vs anti-sistema: a grande ameaça
para Hillary
Numa eleição
muito marcada pela crítica ao «politicamente correto» e ao «business as usual»,
numa dicotomia cada vez mais construída em torno do «sistema vs anti sistema»,
Hillary corre o sério risco de ser atirada para o canto do «sistema» que grande
parte do eleitorado pretende, desta vez, penalizar.
E Trump tem
sabido, pelo menos até agora, surfar a onda do discurso anti-políticos até ao
limite, transformando um aparente handicap (o de não ter qualquer experiência
política, algo quase absurdo para quem conseguirá obter a nomeação presidencial
de um grande partido do sistema como é o GOP), num eventual trunfo.
Mas até
novembro essa dinâmica pode alterar-se um pouco.
Por um lado,
não se vê como possível que a Convenção de Cleveland possa correr
particularmente bem a Trump.
Uma parte
muito significativa do Partido Republicano não o aceitará (Bush pai, Bush filho,
John McCain, Mitt Romney, só para falar dos últimos quatro nomeados
presidenciais do partido…) e isso terá uma expressão eleitoral.
Por outro
lado, no campo democrata, a questão central será: como vai Hillary obter a paz
com Bernie Sanders e os seus surpreendentes 40% de votantes democratas?
As eleições
presidenciais nos EUA são, certamente, política e ideias. Mas são também muito
matemática.
Ora, o que
vai decidir são, mais ou menos, estas contas:
a) que percentagem dos votos
Sanders vão escapar para a abstenção ou até para Trump?;
b) que percentagem da
aversão republicana a Trump vai refletir-se em abstenção ou até em votos
Hillary?;
c) vão os negros, as mulheres, os jovens e os hispânicos (a «coligação Obama» de 2008 e 2012) manter-se fiéis a Hillary ou assistiremos a mudanças dramáticas no comportamento eleitoral desses segmentos?
Apontadas
todas estas inquietações, que fique claro: nesta fase pelo menos, a cinco meses
da grande eleição, Hillary Clinton continua a ser a pessoa mais bem posicionada
para suceder a Barack Obama na presidência dos EUA.
Mesmo
estando ela em tendência descendente e o seu adversário aparentemente a
crescer.
Será assim
até novembro?
Faltam 159 DIAS para
as eleições presidenciais nos EUA.
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