O blogue que, desde novembro de 2008, lhe conta tudo o que acontece na política americana, com os olhos postos nos últimos dois anos da era Obama e na corrida às eleições presidenciais de 2016
sábado, 3 de setembro de 2011
Histórias da Casa Branca: Consegue provar que Obama tem sido um mau Presidente?
A tese dominante é a de que a Presidência Obama está a falhar no fundamental, mas talvez não seja possível demonstrar como fazer melhor num quadro político e económico carregado de adversidades
Consegue provar que Obama
tem sido um mau Presidente?
Por Germano Almeida
«Não sei o que Deus terá ainda de fazer para chamar a atenção dos políticos. Já tivemos um tremor de terra e um furacão»
Michele Bachmann, congressista do Minnesota, candidata à nomeação presidencial republicana, num comício do Tea Party na Florida
Já toda a gente sabe que os tempos têm sido muito difíceis para a Administração Obama.
Os números do desemprego, do défice e, sobretudo, os receios crescentes de que pode estar a vir aí uma ‘double dip recession’, com contornos ainda mais graves do que a tempestade financeira de 2008/2009, fazem com que pareça existir uma conjugação de factores a apontar para uma sentença de que esta será uma Presidência falhada. Certo? Errado.
Quem ouvir a argumentação zangada dos candidatos à nomeação presidencial republicana ficará com a ideia de que Barack Obama tem sido um péssimo Presidente.
E se atentarmos a frases como a que está em destaque na abertura deste texto, proferida por Michele Bachmann (a radical congressista do Minnesota insinua que o tremor de terra na Virgínia e o furacão Irene terão sido… sinais de Deus a penalizar Obama), então percebemos que os ataques ao Presidente dos EUA há muito que já passaram a esfera da racionalidade política.
Michele Bachmann: quando o discurso político dos principais candidatos republicanos cai no domínio da irracionalidade, resta a Obama acreditar que os americanos vão continuar a preferir o seu estilo conciliador
Neste clima de gritaria republicana contra Obama, pode não ser fácil analisar os dados com clareza.
Mas é precisamente por isso que vale a pena olhar com atenção para esta pergunta: há provas que sustentem a tese de que Obama tem sido um mau Presidente? Seria possível fazer melhor neste quadro de extraordinárias dificuldades políticas e económicas?
Para lá da gritaria
Pode ser um exercício quase contranatura nestes tempos de sentenças imediatas, sobretudo quando, na América, vemos agora um batalhão de candidatos à nomeação republicana a rotular Obama dos mais diversos defeitos.
Só que, em política, muitas vezes o que parece não é. Jonathan Alter, colunista da Newsweek e autor do livro ‘The Promise - President Obama, Year One’, aponta, em artigo com o sugestivo título: ‘You Think Obama’s been a bad President? Prove it!’: «Não estou interessado em ouvir ataques ‘ad hominem’ a Obama ou nas generalizações sobre o ‘desapontamento’ que muita gente diz sentir. Quero saber, trabalhando sobre uma base substantiva, porque é que Obama merece estar empatado com Perry e Romney e só uns pontos à frente de Ron Paul e Michele Bachmann, de acordo com sondagem recente da Gallup. Será que o facto de o desemprego se manter a nove por cento faz, por si só, condenar um Presidente, seja ele quem for e faça ele o que faça?»
Alter desafia-nos, por isso, a ver as coisas para lá do que parecem à superfície. E recorda: «Como toda a gente, também eu tenho a minha lista de erros a apontar a Obama, desde ter falhado numa posição mais forte sobre os bancos em 2009 até ter recusado a revogação das Bush Tax Cuts quando os democratas ainda controlavam o Congresso. Talvez não devesse criar expectativas quando falou no «Verão da recuperação» e no discurso «Winning the Future», enquanto a economia não começasse a dar sinais de retoma. Mas será que estas falhas de cálculo são suficientes para que ele não deva ser reeleito?»
No artigo, Alter expõe muito bem a contradição em que tem vivido a Presidência Obama: pelas mesmas decisões, tem recebido críticas à esquerda e à direita – por motivações opostas.
Os estímulos económicos de 2009, a Reforma da Saúde, a Reforma Financeira ou os acordos estabelecidos com os republicanos para o aumento do tecto da dívida são alguns dos exemplos mais visíveis do ‘equilibrismo político’ em que tem oscilado a Presidência Obama.
O estilo conciliador, que o levou a obter uma enorme maioria presidencial a 4 de Novembro de 2008, parece agora virar-se contra Obama. O seu mantra tem sido o de ouvir os dois lados, pôr-se na pele do adversários, absorver diferenças e traçar equilíbrios políticos.
Só que o mantra dominante está mais perto do discurso populista dos republicanos.
Mais xadrez, menos poker
Na campanha de 2008 e no primeiro ano e meio de Presidência, Obama fez valer as suas qualidades de jogador de xadrez: juntou paciência, estratégia e arrojo para resolver dilemas como o ObamaCare ou a Dodd-Frank Bill.
Mas depois de perder o controlo político do Congresso, tudo se complicou. Em crises como a da negociação do aumento do tecto da dívida, o Presidente tentou jogar poker com um Congresso que lhe é incrivelmente hostil. E saiu-se mal.
Ficou célebre a revelação do congressista republicano Eric Cantor, uma das estrelas do Tea Party, ao revelar que, numa das reuniões tensas em que acabou por sair intempestivamente, Obama lançou: ‘Eric, don’t call my bluff…’
Não é um desabafo típico do Barack-que-nunca-perde-o-controlo-da-situação. Mas representa bem o clima de polarização a que se chegou na política americana.
A eleição de Obama não alterou, por si só, uma sensibilidade ideológica dominante na América e que aponta para culpar o poder federal. A quebra de consensos em Washington fez aumentar ainda mais o desagrado do americano comum pela falta de capacidade do poder central em resolver a crise económica – e isso tem reflexos tremendos na popularidade do Presidente, por muito que seja ele o que mais tem feito por evitar este clima.
É relativamente fácil elencar a montanha de dificuldades políticas que atravessa Obama. Mas já é mais difícil demonstrar que era possível fazer melhor.
O dilema justifica continuação nos próximos dois textos.
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