Obama passou a ser favorável ao casamento dos homossexuais: terá assustado algum eleitorado conservador, mas reconquistou a confiança e o entusiasmo dos sectores progressistas. Foi uma posição corajosa e inteligente
Um Presidente com opinião
Por Germano Almeida
“É importante para mim afirmar que
penso que as pessoas do mesmo sexo devem poder casar. Hesitei a determinada
altura quanto ao casamento, em parte por pensar que as uniões civis seriam
suficientes. Fui sensível ao facto de, para muitas pessoas, a palavra casamento
evocar tradições e crenças religiosas. Quando
penso em membros do meu próprio staff, que são incrivelmente empenhados nas
suas relações monogâmicas com pessoas do mesmo sexo, que educam crianças,
quando penso nos soldados, fuzileiros ou marinheiros que combateram sob as
minhas ordens e em nome do país e ainda se sentem constrangidos, mesmo após o
fim da [política] ‘Don’t Ask, Don’t Tell’, concluo que para mim é importante
afirmar que as pessoas do mesmo sexo devem poder casar”
BARACK OBAMA, Presidente dos EUA, em
entrevista à ABC, 10 de Maio de 2012
Os Estados
Unidos da América continuam a ser um país maioritariamente conservador. Mas os
últimos anos têm mostrado que são, também, um país diverso, heterogéneo, e onde
diferentes segmentos procuram ganhar cada vez maior legitimação política e
espaço mediático.
Questões
como o direito dos homossexuais ao casamento civil nunca serão pacíficas, muito
menos consensuais, num país como os EUA.
É verdade que há um ‘lobby gay’ com força e influência em alguns sectores na América, sobretudo em estados como a Califórnia, Nova Iorque e na Nova Inglaterra.
É verdade que há um ‘lobby gay’ com força e influência em alguns sectores na América, sobretudo em estados como a Califórnia, Nova Iorque e na Nova Inglaterra.
Mas é,
sobretudo, verdade que os movimentos ligados à Direita americana que defendem
uma concepção de sociedade que muitos rotulam de retrógrada têm uma força ainda
maior – e financiam congressistas, senadores e meios de comunicação social com
milhões e milhões de dólares.
Nesta guerra
de palavras, ideias e mentalidades, que poluiu a esfera mediática norte-americana
com especial intensidade durante os primeiros anos da Administração Obama,
assumir a defesa clara do direito dos homossexuais ao casamento civil pode não
parecer a estratégia política mais prudente – sobretudo se nos lembrarmos que
as eleições presidenciais são daqui a menos de meio ano.
Uma reacção
mais precipitada à surpreendente declaração de Obama à ABC (acima transcrita)
faria achar que o Presidente cometeu um erro de cálculo que lhe poderá custar
muitos votos, na disputa com Romney do chamado “eleitorado flutuante”.
Mas convém
olhar com mais atenção para esta tomada de posição de Obama.
Histórico e inteligente. Uma conclusão pode logo tirar-se:
esta foi uma declaração histórica. Nunca um Presidente dos EUA (seja em funções
ou fora desse período) tinha assumido publicamente tal posição. Sinal dos
tempos, certamente, mas também um sinal de inteligência por parte de Barack Obama.
É que no
deve e haver entre ganhar e perder votos, até pode ser que Obama tenha vantagem
eleitoral com esta posição.
Estudos
recentes apontam para que cerca de metade dos americanos consideram que os
homossexuais devem ter direito a casar-se. Mais ao pormenor, deve ainda
dizer-se que nos estados chave para a eleição (Ohio, Pensilvânia, Virgínia e
Florida), a relação entre quem concorda e quem está contra será de 47/37.
Obama pode
ter assustado alguns eleitores mais conservadores, ao evoluir a sua posição de
permitir uniões de facto, passando a ser favorável ao casamento dos
homossexuais? Certo.
Mas terá
também reconquistado uma importante margem do eleitorado progressista, que
votou nele em massa em 2008 e mostrou, nestes anos de Presidência, alguma
desilusão com a forma ténue como Obama pegou em algumas destas questões da
moral e dos costumes, relegando-as para a urgência das questões económicas (que
assumiram um domínio excessivo nas prioridades políticas dos últimos três anos
e meio).
Joe Biden, o vice-presidente dos EUA, já tinha assumido idêntica posição, dias antes, no Meet the Press. Mas Obama poderia ter-se escudado na liberdade de pensamento num tema como este, sobretudo porque já tinha mostrado abertura na questão das uniões civis.
Vindo de um Presidente tão ponderado e racional como Barack, esta foi, claramente, uma opção política de Obama. Arriscada, mas, contas feitas, provavelmente vantajosa.
Joe Biden, o vice-presidente dos EUA, já tinha assumido idêntica posição, dias antes, no Meet the Press. Mas Obama poderia ter-se escudado na liberdade de pensamento num tema como este, sobretudo porque já tinha mostrado abertura na questão das uniões civis.
Vindo de um Presidente tão ponderado e racional como Barack, esta foi, claramente, uma opção política de Obama. Arriscada, mas, contas feitas, provavelmente vantajosa.
Marcar as diferenças com Mitt. Mas os pontos marcados por Barack,
nesta corajosa declaração à ABC, podem ser assinalados noutras dimensões.
Por um lado,
foi uma forma de deslocar a agenda deste início de duelo presidencial, que
estava a ser muito focado nas questões económicas – sendo que o lado económico
será talvez o único em que Romney se poderá bater com Obama.
Por outro
lado, foi uma forma de acentuar as suas diferenças para com Mitt Romney.
Perante um
adversário republicano que mudou demasiadas vezes de opinião ao longo dos anos
sobre este tipo de temas – de tal modo que são os próprios republicanos a
acusar Mitt de ser ‘flip-flop’, tão frequentes são as suas mudanças de posição
sobre questões como o aborto, os direitos dos homossexuais – Barack Obama
recuperou a sua identidade de político com opinião própria, que até é capaz de
evoluir o seu pensamento, mesmo em período eleitoral.
É claro que
a verdadeira resposta sobre se esta foi mesmo uma jogada bem-sucedida só
aparecerá a 6 de Novembro, mas a declaração de Obama em favor do direito dos homossexuais
ao casamento civil recoloca Barack como um Presidente com opinião.
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