TEXTO PUBLICADO NO SITE DA TVI24, A 31 DE DEZEMBRO DE 2012:
Faltam poucas horas para que os Estados Unidos caiam, tecnicamente, na «Fiscal Cliff».
Mas, afinal, o que é que isso significa? Fácil de definir, difícil de imaginar: ao mesmo tempo, expiram os cortes fiscais aprovados nos anos Bush e prorrogados por Obama; começam a vigorar dolorosos cortes na despesa, para fazer face ao monstruoso défice; e os EUA atingem o teto da dívida.
Um precipício orçamental que pode fazer encolher a maior economia do Mundo em 600 mil milhões de dólares, um valor tão incrivelmente grande que é quase tão elevado quanto o megapacote que a Administração Obama fez aprovar no Congresso, em 2009, para iniciar a recuperação.
Quer isto dizer que existe um risco real de os EUA recuarem a níveis próximos do início da crise de 2008, depois de terem encetado uma recuperação lenta nos últimos três anos e meio, com a criação de emprego e o retomar do crescimento.
Tudo isto está em causa se não surgir um acordo milagroso em Washington: até ao final do ano que amanhã começa, a América arrisca-se a passar de um crescimento de dois por cento para uma recessão de um por cento; e o desemprego, cuja taxa foi descendo durante o primeiro mandato de Barack Obama mas ainda se mantém relativamente alta para os standards americanos (7.9%), pode chegar a níveis assustadores (acima dos 10%, até ao final de 2013, se a América se despenhar).
Como é que foi possível termos chegado a este ponto? Acima de tudo, porque o sistema político americano, como bem explicava o comentador da CNN Bill Schneider, em entrevista recente ao TVI24.pt, «foi desenhado para montar governos fracos, mas responder bem a grandes crises».
A agenda política de Barack Obama foi relegitimada em novembro passado, com a reeleição. E ela tem um «mantra»: o de carregar fiscalmente os cinco por cento mais ricos, para que se possa aliviar fiscalmente os 95 por cento de americanos que se situam na classe média ou entre os mais desfavorecidos.
O problema é que as eleições de há quase dois meses renovaram a maioria republicana na Câmara dos Representantes.
E o «mantra» dos republicanos é completamente diferente: passa por nunca permitir QUALQUER aumento de impostos, seja para ricos, pobres ou remediados.
Com a discussão em DC extremada e num nível muito pouco recomendável, o ano de 2012 foi marcado por uma espécie de «negação coletiva».
Apesar dos primeiros avisos terem sido feitos por Ben Bernanke, presidente de Fed, ainda em fevereiro, tanto democratas como republicanos foram ignorando estrategicamente o aproximar do «deadline».
Com eleições presidenciais, para o Congresso e para governadores dos estados em novembro, o «establishment» político americano foi-se entretendo com o circo das campanhas e com os interesses eleitorais dos candidatos.
Aqui chegados, a horas de se cair tecnicamente no precipício orçamental, o que é que pode acontecer?
Todos têm a perder. Mas os republicanos perdem mais do que o Presidente. Obama sabe que tem os trunfos na mão e, como fez no verão de 2011, está a mostrar-se um magistral jogador de póquer.
O problema é que terá arriscado de mais, ao perceber o clima de «guerra civil» no Partido Republicano, entre aqueles que querem negociar e os radicais que se opõem a aumentos de impostos a quem ganha mais de um milhão de dólares (!).
Apesar dos democratas se manterem no controlo do Senado, isso não é suficiente para o Presidente consiga resolver uma situação como a Fiscal Cliff.
O nervosismo é geral, mas Obama tem mais instrumentos para minimizar o impacto da queda.
O Presidente já tem um plano B (que o Senado apresente um plano de emergência que faça a ponte até que haja acordo em janeiro) e um plano C (medidas executivas da sua administração, de aplicação imediata).
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