domingo, 8 de janeiro de 2012

Histórias da Casa Branca: Ainda haverá uma 'América de Obama'?


O «ano três» de Barack Obama na Casa Branca agravou os fantasmas da «desilusão» em temas como a crise económica, mas confirmou sucessos na frente externa e até terminou com indicadores positivos. Segurar apoios nos segmentos que lhe deram uma enorme maioria em 2008 pode ser a chave para a reeleição em Novembro


Ainda haverá uma ‘América de Obama’?

Por Germano Almeida


(sobre as eleições presidenciais norte-americanas de 2012)
“Se vencer um candidato republicano, creio que o isolamento dos EUA poderá tomar uma forma mais radical do que aquela que antecedeu a sua participação militar nas duas guerras mundiais do século XX. Os candidatos republicanos que se alinham constituem, para mim, uma extraordinária ameaça para a Europa, mas sobretudo para os EUA, cujos valores, cultura, ciência, etc., eu aprendi a amar, pois foi lá que me ensinaram a democracia”

(será que Obama consegue ser reeleito?)
“É uma incerteza que perturba quem (eu incluído) acreditava que Obama faria a diferença. O sucesso dos seus programas-bandeira, como a reforma dos cuidados de saúde ou as políticas ambientais e de energia, virá a ser provavelmente muito reduzido, e a "amabilidade" com que tratou Wall Street não lhe será perdoada. Também não é claro que um segundo mandato lhe permita acabar o que começou, por não ter o apoio político. Temo que venha a ser um 'one term president', como os republicanos estão apostados em fazê-lo. Votaria, mais uma vez, nele.”

JOÃO LOBO ANTUNES, neurocirurgião que viveu e leccionou em Nova Iorque durante 13 anos, em entrevista ao Diário de Notícias


O ano que agora começou será decisivo para se determinar a sentença sobre o «caso Obama».

Há três anos e pouco, uma onda de entusiasmo varreu a América: cansada de oito anos de uma Administração Bush que atiraram os EUA no descrédito internacional e num défice crónico e profundo, uma larga maioria de americanos voltou a provar que é mesmo «tudo possível» na terra da oportunidade – e elegeram um Presidente com características improváveis e um nome de sonoridade entre o muçulmano e o africano.

Com 80 por cento do seu mandato presidencial já cumprido, Barack Obama ainda não conseguiu afastar o fantasma da desilusão – e continua a ser perseguido por uma crise económica de longa duração.

Tendo partido com uma das mais largas e diversificadas maiorias presidenciais da história política americana, Barack Obama foi perdendo a sua base de apoio, a tal ponto que se torna legítimo perguntar: ainda se poderá falar numa «América de Obama»?

“Yes” na política externa…
O «ano três» da Presidência Obama foi particularmente positivo na frente externa: Osama Bin Laden foi apanhado e morto, um objectivo que a Casa Branca e os serviços de inteligência norte-americanos buscaram durante dez anos; os prazos para a retirada do Iraque foram cumpridos; a intervenção militar na Líbia teve o desfecho desejado, com a deposição de Kadhaffi, e inaugurou uma nova forma de os EUA participarem numa acção internacional em grande escala, com intervenção directa na primeira fase do conflito e posterior cedência da liderança do processo a ingleses e franceses.

O «realismo» que Barack Obama assumiu para as relações externas (definido em Oslo na aceitação do Nobel da Paz ou no discurso de Praga) foi aprimorado em 2011: os EUA devem ser parte activa dos grandes acontecimentos internacionais, mas liderar não obriga a superpotência miliar a fazer as despesas de todas as grandes acções.

A saída do Iraque foi outra altura aproveitada por Obama para recordar que «é tempo de voltar ao essencial e apostar na recuperação económica dos EUA».

Mas a História tem-nos mostrado que a política externa, sendo importante para a imagem global dos Presidentes dos EUA, não é decisiva para a sua reeleição. Se assim fosse, Obama já tinha a vitória assegurada em Novembro.

… “No” na frente doméstica
Os grandes problemas têm estado na frente interna. Apesar dos indicadores de alguma recuperação da economia americana no último trimestre de 2011, a verdade é que o desemprego na América continua alto (8,5%, sendo que, historicamente, nenhum Presidente americano conseguiu ser reeleito com uma taxa de desemprego superior a 7,5%).

Nas primárias republicanas, alguns candidatos do GOP (sobretudo Mitt Romney, Michele Bachmann e Rick Perry) têm sublinhado o facto de que Obama chegou à Casa Branca sem qualquer experiência executiva ou empresarial, apontando esse dado como uma forte adversidade de Barack numa altura em que a Economia é, ainda mais, o factor que conta.

A evolução dos próximos meses deverá ser, nesse capítulo, decisiva para Obama: ou o desemprego, que até já começou a decrescer, desce de forma mais acentuada ou ficará difícil vender a ideia de que será ele o candidato da recuperação económica.

É verdade que os EUA foram uma das escassas excepções positivas, em 2011, nas bolsas mundiais: num cenário quase generalizado de perdas enormes, só cinco ou seis países tiveram ganhos: Venezuela, Indonésia, Filipinas, Islândia, América.

Mas isso não chega para quem ainda se pode reivindicar de ser a maior economia do Mundo e o farol das grandes ideias e da inovação.

Ameaçada pelo crescimento exponencial da China, da Índia e do Brasil, a América precisa urgentemente de ganhar gás na Economia, na Inovação e na Ciência.

Obama, que baseou parte da sua campanha nessa ideia, tem falado menos sobre essas questões (o discurso “Winning the Future” terá sido o último grande momento do género), forçado que está a negociar com o Congresso a melhor forma de preparar cortes orçamentais.

Que plataforma para a reeleição?
Dias depois do Iowa, e já com as primárias do New Hampshire e da Carolina do Sul a bater à porta, o foco das atenções dos media, dos ‘pundits’ e das empresas de sondagens está, obviamente, nos candidatos republicanos.

Mas as últimas semanas têm denotado uma tendência consistente de recuperação da Taxa de Aprovação de Obama.

Mesmo assim, não é muito claro, nesta fase, se o Presidente está em condições de conseguir segurar maiorias nos segmentos que o lançaram para a eleição em 2008. Há alguns sinais que apontam para que o eleitorado jovem (que votou em massa em Obama há três anos) tenha fortes movimentações para a abstenção e mesmo para o candidato republicano.

As mulheres, os latinos e os judeus são outros três segmentos a olhar com especial atenção. Sobretudo nos estados do Midwest, a maioria feminina que elegeu Obama em 2008 pode estar em perigo, devido ao desemprego e à Reforma da Saúde (particularmente impopular no eleitorado feminino centrista).

Por enquanto, o voto hispânico continua a pender para Obama, mas é outro segmento que o Presidente poderá ter dificuldade em segurar. E quanto aos judeus, que embora não decidam demograficamente as eleições na América têm sempre um peso muito forte a nível de ‘lobby’ e de financiamento, são votantes de peso em estados como Nova Iorque ou Nova Jérsia, que Obama não poderá dar-se ao luxo de perder em Novembro.

Não se admirem, por isso, que as posições da Administração Obama em relação à questão israelo-palestiniana sejam menos neutrais nos próximos meses. “It’s all about politics”.

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