segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O que fazer no AfPak?


http://www.abola.pt/mundos/ver.aspx?id=179940

Amanhã, terça, o Presidente anuncia grandes decisões para o AfPak. Vale a pena, por isso, recuperar o texto publicado a 6 de Novembro de 2009, na rubrica Histórias da Casa Branca, do site de A Bola:

O que fazer no Afeganistão e Paquistão?

Por Germano Almeida


Suprema ironia: no dia em que lhe foi atribuído o Prémio Nobel da Paz, Barack Obama tinha agendada uma reunião com o Conselho de Segurança Nacional, para avaliar riscos e vantagens de uma nova estratégia para o Afeganistão.

Em cima da mesa estava a possibilidade de enviar mais 40 mil efectivos – hipótese tremenda para quem acabara de ser agraciado com a mais prestigiada distinção de quem luta pela paz no Mundo.

A reunião realizou-se horas depois do anúncio-surpresa da Academia Norueguesa e Obama ouviu da boca dos seus conselheiros de segurança, e de altas patentes militares americanas, notícias alarmantes sobre o avanço dos taliban no terreno e uma crescente vulnerabilidade das tropas anglo-americanas.

Era difícil encontrar melhor imagem para ilustrar o dilema que atravessa Obama: se aprovar o reforço de efectivos em número tão significativo, está a dar razão à leitura do general Stanley McChrystal (comandante do Exército americano em Cabul), que, num relatório devastador (divulgado, parcialmente, pelo Washington Post e nunca desmentido por fontes oficiais), quase implorou à Casa Branca uma mudança radical na estratégia americana para o Afeganistão.

No documento, McChrystal avisa que o próximo ano será «decisivo» para um possível sucesso americano em Cabul. E exorta o Presidente a aprovar um reforço que pode ir de 40 até 60 mil efectivos, de modo a inverter uma tendência que já chega a uma média de dois soldados americanos mortos por dia.

Mas Obama também sabe que uma decisão como essa implicará enorme perda de popularidade, numa altura em que os esforços de guerra no Afeganistão e no Paquistão (o AfPak) são reprovados, de forma maciça, pela opinião pública.

A retirada «não é uma opção»
Já se sabia que o Afeganistão ia ser «a guerra de Obama». Foi o próprio Presidente que, enquanto candidato presidencial, apontara a mudança de direcção, de Bagdad para Cabul, de modo a «corrigir o erro trágico da Administração Bush e virar a agulha para quem realmente ameaçou a segurança interna dos EUA: os taliban e a Al Qaeda.»

A leitura estava certa e só se desiludiu quem quis ver em Obama o «herói anti-guerra» que ele nunca foi - nem nunca poderia ser. Logo no discurso de 2002, quando era um desconhecido senador estadual no Illinois, Barack condenou a guerra do Iraque não por ser «uma guerra», mas por ser «uma guerra estúpida».

O seu «realismo» fá-lo agora perceber que o agravamento da situação no Afeganistão volta a colocar os Estados Unidos numa posição de enorme risco. «A retirada, neste momento, não é uma opção. Os taliban estão a ganhar terreno e a nossa estratégia está a falhar», admite o secretário da Defesa, Robert Gates.

O senador John McCain, do Arizona, nomeado presidencial republicano em 2008, já desafiou Obama (para quem perdeu a corrida eleitoral do ano passado) a tomar a decisão mais impopular. «A situação no terreno é tão delicada que o Presidente deve seguir a indicação do general McChrystal», apontou, em entrevista a John King, na CNN.

McCain, ele próprio um herói militar, é voz respeitada nos dois campos partidários. A forma clara como defende o reforço de efectivos pode vir a ter influência na decisão de Obama: «Percebo que o Presidente se encontra num enorme dilema, mas em alturas como esta o pior que se pode fazer é tentar agradar a todos, tomando uma decisão salomónica, como um envio de um número muito reduzido de elementos. Isso não ia resolver nada.»

Não há palavras que resolvam
Em Março passado, Obama já aprovara um reforço de 21 mil soldados. No final de 2009, prevê-se que os EUA tenham 68 mil efectivos no Afeganistão.

Até agora, tem vigorado uma estratégia de «contra-insurreição», que exige a presença contínua de um elevado contingente no terreno. Há quem defenda uma mudança para uma estratégia de «contraterrorismo», baseada em acções localizadas, 'hi tech', com uso de mísseis telecomandados e enorme poupança de recursos humanos – opção que reduzirá o número de baixas.

O vice-presidente Joe Biden já admitiu ser essa a sua preferência, numa nítida (e desconfortável) divergência com o general McChrystal. Para Ariana Huffington, fundadora do Huffington Post, «se Obama escolher a estratégia do general McChrytal, e aprovar um reforço de 40 mil homens contra a opinião do seu vice-presidente, Joe Biden devia demitir-se».

O Presidente está em reflexão e ainda não anunciou quando vai tomar as grandes decisões para o AfPak. Para já, só se sabe uma coisa. «Não será para os próximos dias», responde, lacónico, Robert Gibbs, porta-voz da Casa Branca.

Até agora, o notável poder oratório de Obama tem sido capaz de resolver os problemas mais complicados. Mas a espada afegã não se amacia com discursos eloquentes. Como resolverá Barack este dilema?

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