sábado, 8 de setembro de 2012

Histórias da Casa Branca: Descer à terra e reforçar diferenças na nomeação de Obama


TEXTO PUBLICADO NO SITE DE A BOLA A 7 DE SETEMBRO DE 2012:


Descer à terra e reforçar diferenças na nomeação de Obama

Por Germano Almeida





«Mais tempo para concretizar a mudança. O estado da Economia americana não é positivo, mas o caminho iniciado pelo Presidente Obama em janeiro de 2009 inverteu a tendência desastrosa que estava a conhecer na fase final dos anos Bush e é preciso continuar esse percurso por mais quatro anos.



Foram estas as linhas fortes da Convenção Democrata que, durante três dias, energizaram as bases do partido do burro, em Charlotte, Carolina do Norte. «Forward», «Opportunity», «More four years» foram as tiradas mais lançadas.



Dias antes, em Tampa, na Florida, a Convenção Republicana tinha demonizado a herança económica de Barack Obama, acusando o Presidente de ter atirado a América para o endividamento, o défice excessivo e o desemprego.



Os democratas tentaram desmontar esta ideia, acusando-a de ser simplista. O argumento para a reeleição de Obama é, muito claramente: era difícil fazer melhor, tendo em conta o estado das coisas no final de 2008; para que o panorama volte a ser favorável, há que dar uma segunda oportunidade a Barack Obama.



As intervenções na Convenção Democrata destacaram também algumas das conquistas do primeiro mandato presidencial de Obama: a Reforma da Saúde (aprovada no Congresso e confirmada no Supremo Tribunal); a recuperação da indústria automóvel; a criação de 4,5 milhões de empregos nos últimos 29 meses; a eliminação de Bin Laden e a retirada do Iraque e do Afeganistão; os programas da Administração Obama de alargamento no acesso à Educação e nas linhas de crédito para universitários poderem pagar os seus cursos.



Para os eleitorados tradicionais do Partido Democrata, estas são conquistas importantes – de tal modo, que a ideia de renomear Barack Obama como candidato presidencial foi consensual.



O problema é que muitas das conquistas de Obama como Presidente não são populares: não é líquido que a Reforma da Saúde dê mais votos a Obama do que vá tirar; mesmo a salvação da indústria automóvel implicou um gasto federal que está longe de ser pacífico.



Mas foram três noites bem conseguidas – com momentos emocionantes (como os discursos de Michelle Obama e Julián Castro), exemplos de coragem americana (Gabrielle Giffords a aparecer no palco, ajudada por Debbie Wasserman Schultz, perante uma plateia extática e de lágrimas nos olhos) e mensagens de clara eficácia política (Bill Clinton a decretar que nenhum Presidente, nem ele, seria capaz de em apenas quatro anos resolver o que Barack Obama herdou; Ted Kennedy, recordado em tributo, a arrasar Mitt Romney num debate para o Senado na década de 90).



Fixar segmentos

Obama venceu claramente em 2008 em vários segmentos: negros, judeus, jovens, mulheres, hispânicos, ‘swing states’.



Perante a desilusão de muitos eleitores que representam esses segmentos, a grande preocupação da campanha Obama é fixar esses segmentos. É uma questão de aritmética: se isso for conseguido, o Presidente será reeleito.



Não foi, por isso, de estranhar a aposta forte que o alinhamento em Charlotte deu às mulheres. Elizabeth Warren, candidata ao Senado pelo Massachussets e uma pessoa próxima do Presidente na primeira fase do mandato em questões como a regulação financeira e a proteção dos consumidores, teve um dos discursos mais destacados (precedeu Bill Clinton no segundo dia).



Gabrielle Giffords, ex-congressista do Arizona que foi vítima de atentado a tiro em Tucson, Caroline Kennedy (única filha viva de JFK), Eva Longoria e Scarlett Johansson foram outras das apostas femininas da convenção.



No caso de Eva, além da óbvia ligação ao ‘star power’ de Hollywood (que volta a estar em peso com Obama), há também a conexão com o eleitorado latino – que poderá ser decisivo em estados como o Colorado, o Nevada ou a Florida. Quanto a Scarlett, fez apelo claro ao eleitorado jovem para não ficar em casa – e votar no dia 6 de novembro.



Mas o maior trunfo para essa junção de latinos e jovens foi, sem dúvida, o destaque dado a Julián Castro. Presidente da sétima câmara mais populosa da América, o jovem mayor de San António, Texas, de apenas 37 anos, contou a uma comovida plateia a sua história de sucesso nos EUA, graças à avó mexicana que foi para a América para dar uma oportunidade de educação à filha e aos netos.



Castro foi visto como uma espécie de... Barack Obama em 2004. Não terá sido tão brilhante, mas lançou um dos melhores soundbytes da Convenção: «Opportunity today, prosperity tomorrow». Uma ideia profundamente democrata e repescada, por exemplo, no discurso de Eva Longoria.



Clinton brilhante, Michelle comovente

Mas as grandes intervenções do conclave democrata (para lá, obviamente, da aceitação de nomeação de Barack Obama) foram de Michelle Obama e Bill Clinton.



A Primeira Dama pode até garantir que não tem ambições políticas. Mas depois do seu discurso de terça à noite, até houve quem lançasse a possibilidade de Michelle Obama concorrer à nomeação presidencial democrata em 2016.



Michelle garantiu que Barack «continua a ser o mesmo» e não mudou depois de ser Presidente. A esposa de Obama fez um poderoso argumento pela reeleição, mobilizando sobretudo o eleitorado feminino e ajudando a fazer renascer o espírito da campanha de 2008.



Quanto a Bill Clinton... bem, terá feito, de acordo com Paul Begala (seu estratega quando era Presidente e antigo assessor da campanha presidencial de Hillary Clinton), «o melhor discurso desde que deixou a Casa Branca».



Bill juntou um discurso muito bem articulado em termos retóricos com uma grande substância. Foi ao pormenor, acusou os republicanos de obstrucionismo e definiu as linhas de argumentação para a reeleição de Obama: «O argu¬mento para a reeleição de Obama é este. Ele her¬dou uma econo¬mia pro¬fun¬da¬mente dan¬i¬fi¬cada. Mas pôs um fundo ao poço, e começou o longo, duro processo de recu¬per¬ação, con¬stru¬indo uma econo¬mia mais mod¬erna e mais equi¬li¬brada, capaz de pro¬duzir mil¬hões de bons empre¬gos, novas e vibrantes empre¬sas e riqueza para os inovadores. Agora, esta¬mos onde gostaríamos de estar? Não. O Pres¬i¬dente está sat¬is¬feito? Claro que não. Mas esta¬mos mel¬hor do que está¬va¬mos quando ele tomou posse».



Ainda houve espaço para John Kerry (possível secretário de Estado de um segundo mandato presidencial de Obama) arrasar as credenciais de Mitt Romney em política externa e para Joe Biden, no discurso de aceitação da nomeação vice-presidencial, endeusar Obama por ter salvado a indústria automóvel («este homem tem coragem na sua alma, compaixão no coração e uma espinha de aço», disse Joe sobre Barack, e questionar, criticamente: «Como é possível que Mitt Romney, tendo crescido a gostar de carros, não ter percebido como era fundamental salvar Detroit?»





«O melhor caminho para seguir em frente»

Depois de Michelle o ter humanizado, e de Bill Clinton ter explicado de forma brilhante as razões pelas quais os americanos lhe devem dar uma segunda oportunidade, Barack Obama tinha o caminho livre para fazer um discurso de aceitação da nomeação presidencial virado para o futuro e marcado por um tom positivo.



Em mais um momento de grande qualidade retórica, Obama focou-se em «olhar para a frente», prometendo um «melhor caminho para o futuro». «Não estou a tentar dizer-vos que o caminho será fácil ou rápido. Nunca o fiz. Não me elegeram para dizer o que querem ouvir. Elegeram-me para vos dizer a verdade. E a verdade é que vai demorar mais quatro anos para resolver desafios que se acumularam durante décadas. Mas ouve isto, América: os nossos problemas podem ser resolvidos. Os nossos desafios podem ser vencidos. O caminho que vos ofereço pode ser duro, mas leva-nos para um sítio melhor», apontou Barack.



Obama deu prioridade em marcar a diferença em relação à visão de Romney: «Se rejeitam a noção de que a promessa desta nação está reservada a alguns, a vossa voz tem que ser ouvida nesta eleição. Não achamos que o Governo é a solução para tudo. Mas também não achamos que o Governo é a fonte de todos os problemas».



Faltam 59 DIAS para as eleições presidenciais nos Estados Unidos.»

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