sábado, 15 de setembro de 2012

Histórias da Casa Branca: Pode um Inverno Árabe baralhar as contas eleitorais na América?


TEXTO PUBLICADO NO SITE DE A BOLA A 15 DE SETEMBRO DE 2012:


Pode um Inverno Árabe baralhar as contas eleitorais na América?

Por Germano Almeida




«E eis que, de repente, a frente internacional pode voltar a contar.



Os dados desta eleição presidencial pareciam destinados a ser decididos pela parte económica – e muitos até garantiam que os feitos da Administração Obama na política externa (fim da guerra no Iraque; cumprimento dos prazos de retirada do Afeganistão; intervenção na Líbia com deposição e morte de Khadaffi; eliminação de Osama Bin Laden e de muitos outros líderes da Al Qaeda) não iriam servir de muito nas contas eleitorais de 6 de novembro.



Mas um país como os Estados Unidos tem sempre um papel relevante naquilo que se passa no Mundo. É certo que a posição dominante do eleitorado americano aponta para uma maior preocupação com as questões domésticas e uma certa desvalorização dos temas internacionais. Mesmo assim, o modo como um Presidente americano lida com a «liderança dos Estados Unidos no Mundo» conta na avaliação que os diferentes segmentos fazem dele.



Os ataques brutais efetuados ao consulado americano em Bengasi (que resultaram na morte do embaixador Chris Stevens e de outros três funcionários diplomáticos norte-americanos) podem ter introduzido um dado novo na corrida eleitoral norte-americana.



Os atos funcionaram como rastilho para o barril de pólvora que já se sentia em alguns países do mundo árabe. O motivo inicial teve a ver com um filme (mal feito e absolutamente lamentável), produzido na América e financiado por interesses judaicos, que insulta de forma relativamente primitiva o islão.



O caso - que faz lembrar a questão dos ‘cartoons’ contra Maomé feitos na Dinamarca há alguns anos -- pode ter servido de pretexto para algo bem mais profundo e preocupante, se olharmos para as réplicas tentadas, nos dias seguintes, no Iémen, na Tunísia e no Sudão.



Nos últimos dois anos, a Primavera Árabe surpreendeu até os peritos o Médio Oriente, provocando a queda de ditadores como Mubarak, Ben Ali ou Khadaffi e abrindo novas perspetivas para a região.



Tendo partido de diversas vontades da sociedade civil e militar de países como a Tunísia, o Egito ou a Líbia, foi patrocinado, à distância, pela administração norte-americana.



A questão é que os contextos políticos, religiosos e militares desses países está longe de ficar claro. No Egito (de longe, o país mais influente entre os que contaram na Primavera Árabe), a vitória eleitoral da Irmandade Muçulmana e consequente escolha de Mohamed Morsi para a presidência, foi sinal de preocupação para os interesses americanos na região.



Visões diferentes de ocupar a cadeira



Os republicanos têm acusado Barack Obama de ser um Presidente demasiado macio na questão do Médio Oriente. Por estes dias, os comentários políticos na Fox arrasam as credenciais de Obama no problema israelo-árabe, acusando o Presidente de não ser claro na defesa de Israel e de não ter feito tudo para evitar a emergência de um Irão nuclear.



Na Convenção Republicana, em Tampa, Condoleezza Rice, secretária de Estado no segundo mandato de George W. Bush, apontou: «Quando os Estados Unidos não exercem devidamente a sua liderança no Mundo, há dois perigos que corremos: cairmos no caos, se esse espaço permanecer vazio; ou sujeitarmo-nos a que essa liderança seja ocupada por países que não tenham os nossos valores e não respeitem os nossos interesses».



A rábula da «cadeira vazia», feita por Clint Eastwood também em Tampa, tinha, precisamente, como simbologia essa ideia de que Barack Obama não estava a ocupar devidamente o lugar de «commander in chief».



A perspetiva dos democratas é bem diferente. Obama tem tido uma leitura mais restritiva do uso do poder presidencial na frente externa – apontando para um «realismo» que, em muitos aspetos, se aproxima do exercício efetuado por Bush pai.



Como muito bem referiu no discurso de aceitação da nomeação presidencial, feito em Charlotte, Obama considera que «é tempo de aplicar o conceito de ‘nation building’ na América e não no Iraque ou no Afeganistão».



Barack recordou que «na visão aérea de Manhattan já se vê uma nova torre a crescer e Osama Bin Laden está morto». O Presidente tem, por isso, uma visão pragmática das prioridades da política externa: contenção do terrorismo e a dissuasão do programa nuclear iraniano.



Para a visão de Obama, isso não significa uma menor influência da América no Mundo. Significa, isso sim, uma nova abordagem das questões internacionais, numa altura em que a prioridade tem que ser a da «recuperação económica em casa, de forma a criar empregos na América. É tempo de entregar aos iraquianos o futuro do Iraque e aos afegãos o futuro do Afeganistão».



Obama condena filme, Romney com reação precipitada



Em momentos como o do brutal ataque a diplomatas americanos na Líbia, a força da América faz-se ouvir. A reação de Barack Obama e de Hillary Clinton foi clara e imediata.



O Presidente condenou os ataques, fez questão de não os confundir com as lideranças políticas da Líbia e do Egito, mas também condenou o filme que deu origem ao problema.



Hillary, numa sentida evocação dos funcionários do Departamento de Estado mortos em serviço, lembrou: «No corredor de entrada do Departamento de Estado, os nomes daqueles que caíram em serviço estão inscritos no mármore. Os nossos corações despedaçam-se perante cada um deles. E agora, por causa desta tragédia, temos mais heróis para honrar e mais amigos para confortar».



A secretária de Estado não deixou de notar a ironia da questão: o embaixador americano foi morto em Bengasi, a cidade que os EUA ajudaram a libertar. E Bernard Henri-Lévy, filósofo francês com fortes ligações à Líbia, lembrou: «O embaixador Chris Stevens era um brilhante homem de ação e foi um dos maiores amigos da Líbia neste processo de libertação».



Mitt Romney apressou-se a criticar Obama por, aparentemente, «não ter condenado suficientemente» os ataques. O Presidente replicou, dizendo que Romney voltou a mostrar que, nestas questões, «primeiro dispara e só depois aponta ao alvo».



John Kerry, possível secretário de Estado num segundo mandato de Barack Obama e líder do Comité de Relações Externas do Senado, observou: «Este não é tempo para fazer política. Mitt Romney voltou a mostrar a sua inabilidade para temas internacionais e, sinceramente, parecia que não sabia do que estava a falar».



As críticas aos comentários de Romney estenderam-se ao corpo diplomático e comentadores diversos – e recolocaram a questão sobre se o nomeado republicano tem mesmo uma «dimensão presidenciável».



Faltam 52 DIAS para as eleições presidenciais nos Estados Unidos.»

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